Distúrbios de
aprendizagem na visão de uma Professora
A aluna Fernanda Morisson entrevista a professora Sirley Brandão,
funcionária do Instituto Federal Fluminense, que conta com cerca de quarenta
anos de experiência docente e atualmente é coordenadora do NAPNEE (Núcleo de
Apoio a Pessoas com Necessidades Especiais) do já referido instituto.
Você já deu aula para algum aluno
com distúrbios de aprendizagem diagnosticado?
Sim. A pessoa estava no segundo grau e tinha
discalculia.
Você já chegou a identificar um distúrbio em
algum aluno que ainda não tinha sido diagnosticado?
Sim, pelo jeito,
porque ele tinha dificuldade.
O aluno a que você se refere é o
mesmo da pergunta anterior?
Sim. Eu percebi
o distúrbio, e quando perguntei à coordenação me disseram que realmente era o
caso. Quando percebi isso, comecei a pesquisar, para ver como eu poderia agir
com esse aluno. Aí pesquisei na internet, li até uma monografia que uma pessoa
fez sobre o assunto e vi qual era o procedimento, que era o mesmo que eu já
estava fazendo.
Como era o aluno e como ele se comportava?
Quieto, só
falava “Ah, não consigo entender isso!”. Ele queria entender, mas não
conseguia. Ele falava quando não conseguia entender, aí a gente sentava perto
dele, lia o enunciado e explicava passo a passo, aí ele conseguia chegar à
conclusão. Ele estava interessado, mas não conseguia aprender.
Quais dificuldades ele apresentava?
A única
dificuldade dele era na hora de resolver problemas, de, por exemplo, associar
números, fazer correspondências... Nas outras disciplinas ele não apresentava
dificuldades. O que facilitava era ir lendo para ele as questões que precisavam
de cálculo, porque ler pausadamente facilita.
O aluno tinha tratamento
diferenciado?
Não, não era
diferenciado. Comigo, como eu dava aula de matemática e de física, eu procurava
sempre fazer de maneira diferente.
Por conta própria?
É, por conta
própria. Geralmente, quando o aluno tem discalculia, ele também tem disgrafia
ou outro distúrbio, mas isso não é tão percebido. Ele consegue driblar as
outras dificuldades, mas a do cálculo fica evidente.
Qual era sua relação com o aluno?
Era uma relação
próxima.
A instituição fornecia algum apoio/orientação? Existia alguma forma de
acompanhamento?
Não, nenhuma
orientação nem suporte. Mas toda pessoa que tem um tipo de transtorno deveria
ser acompanhada por um psicopedagogo.
Havia alguma adaptação às suas
necessidades?
Quando você vai
dar uma questão para uma pessoa com distúrbio você tem que ser bem objetivo,
fazer questões bem objetivas. Não adianta ficar floreando, como nas questões
que você tem uma introdução, um texto para depois perguntar. Você tem que ser
bem objetivo na pergunta. Eu fazia o seguinte: era a mesma matéria, tinha que
responder do mesmo jeito, só era que perguntado de maneira diferente. Agora,
uma coisa muito importante é aumentar autoestima dele, porque ele acha que
nunca vai aprender. Eu sempre dizia “você é capaz, é inteligente, vai
conseguir”, porque ele se achava inferior em relação aos outros, porque os
outros faziam rapidinho os cálculos e ele não, então você tem que mostrar à ele
que ele é capaz, e às vezes ele tem um grau de inteligência grande, um QI alto,
só que tem esse distúrbio na área de exatas.
Como
era o aproveitamento escolar desses alunos em relação aos colegas de classe?
Era bom, porque
nas outras disciplinas ele era bom, e só nessas disciplinas de cálculo que ele
tinha dificuldade. Aí eu comecei a observar e a partir daí, com essas coisas e
fazendo esse trabalho, ele conseguiu.
Então no início ele tinha notas
baixas em matemática e física?
Bem baixas. Se
eu entregasse a prova a ele e não falasse nada ele entregava a prova em branco.
Ele pegava a prova e falava assim: “eu não vou conseguir”. Aí eu dizia “não,
você consegue”! Aí eu sentava do lado dele e lia a prova porque outra coisa
interessante é o tutor, ter uma pessoa do lado, um monitor quando tem
dificuldade.
Como você vê essa questão dos distúrbios de aprendizagem?
Eu acho que
primeiro, o aluno tem que vir com o diagnóstico e depois você tem que mostrar
para o professor o que tem que ser feito, porque o professor muitas vezes não
tem o conhecimento sobre o que tem que fazer. Então, primeiro, os pais tem que
levar o diagnóstico, porque tem que ter diagnóstico. E depois, a instituição
deve encaminhar para um atendimento especializado, dar uma orientação para o
professor, o que é o mais importante, porque a grande relação do aluno vai ser
com o professor. Mas é fundamental a questão da autoestima.
Você acha que o professor tem
suporte para lidar com essa realidade?
A instituição
tem que ter um suporte, como um psicopedagogo, mesmo que o aluno já seja
diagnosticado, e este suporte deve estar ali para ajudar o professor dando
orientações sobre o que ele tem que fazer, mostrando a maneira mais prática e
eficiente de lidar com o aluno.
Você acha que os professores estão
preparados para essa realidade?
Hoje, na
formação do professor ele tá aprendendo sobre isso, e o professor tem que se
aprofundar, não tem jeito, porque na faculdade eles dão uma pincelada “olha,
existe isso, isso e isso assim”, mas quando você encara a realidade e encontra
com o aluno, é aí que tem que procurar qual é o caminho que tem que ser
seguido.
Considera que a mentalidade acerca do
tratamento desses alunos tem mudado?
A mentalidade
tem mudado bastante. Antes, eles achavam o seguinte: “esse aí vamos deixar de
lado porque ele é retardado, ele não vai chegar a lugar nenhum”. Agora não,
eles procuram saber o que está acontecendo para poder trabalhar em cima disso.
O que você acha que um professor pode
conseguir realizar em sala de aula para ajudar um aluno com distúrbios? Quais
seriam os limites para a atuação do professor?
Primeiro você
tem que conhecer o aluno e aí o que acontece é que é muito difícil em uma sala
grande, mas você percebe quando um comportamento é diferente dos demais, porque
ele quer aprender e não consegue, alguma coisa está dificultando essa
aprendizagem. Então eu acho que o professor tem que fazer aí é descobrir que o
aluno tem essa particularidade e ajudar e, contribuir para ele se desenvolver. Ele
tem que adaptar a avaliação e se adaptar à dificuldade do aluno, o que
geralmente não é feito. Então, o
professor tem que ter boa vontade e o suporte.
Entrevista elaborada pelas alunas Dayana Paes de Araujo, Fernanda Christina
de A. G. Morisson, Luma Silva Souza e Mírian Belarmindo do oitavo período de
Geografia.