sábado, 22 de fevereiro de 2014

Distúrbios de aprendizagem na visão de uma Professora

A aluna Fernanda Morisson entrevista a professora Sirley Brandão, funcionária do Instituto Federal Fluminense, que conta com cerca de quarenta anos de experiência docente e atualmente é coordenadora do NAPNEE (Núcleo de Apoio a Pessoas com Necessidades Especiais) do já referido instituto.

Você já deu aula para algum aluno com distúrbios de aprendizagem diagnosticado?
Sim.  A pessoa estava no segundo grau e tinha discalculia.

 Você já chegou a identificar um distúrbio em algum aluno que ainda não tinha sido diagnosticado?
Sim, pelo jeito, porque ele tinha dificuldade.

O aluno a que você se refere é o mesmo da pergunta anterior?
Sim. Eu percebi o distúrbio, e quando perguntei à coordenação me disseram que realmente era o caso. Quando percebi isso, comecei a pesquisar, para ver como eu poderia agir com esse aluno. Aí pesquisei na internet, li até uma monografia que uma pessoa fez sobre o assunto e vi qual era o procedimento, que era o mesmo que eu já estava fazendo.

            Como era o aluno e como ele se comportava?
Quieto, só falava “Ah, não consigo entender isso!”. Ele queria entender, mas não conseguia. Ele falava quando não conseguia entender, aí a gente sentava perto dele, lia o enunciado e explicava passo a passo, aí ele conseguia chegar à conclusão. Ele estava interessado, mas não conseguia aprender.

 Quais dificuldades ele apresentava?
A única dificuldade dele era na hora de resolver problemas, de, por exemplo, associar números, fazer correspondências... Nas outras disciplinas ele não apresentava dificuldades. O que facilitava era ir lendo para ele as questões que precisavam de cálculo, porque ler pausadamente facilita.



O aluno tinha tratamento diferenciado?
Não, não era diferenciado. Comigo, como eu dava aula de matemática e de física, eu procurava sempre fazer de maneira diferente.

Por conta própria?
É, por conta própria. Geralmente, quando o aluno tem discalculia, ele também tem disgrafia ou outro distúrbio, mas isso não é tão percebido. Ele consegue driblar as outras dificuldades, mas a do cálculo fica evidente.

            Qual era sua relação com o aluno?
Era uma relação próxima.

            A instituição fornecia algum apoio/orientação? Existia alguma forma de acompanhamento?
Não, nenhuma orientação nem suporte. Mas toda pessoa que tem um tipo de transtorno deveria ser acompanhada por um psicopedagogo.

Havia alguma adaptação às suas necessidades?
Quando você vai dar uma questão para uma pessoa com distúrbio você tem que ser bem objetivo, fazer questões bem objetivas. Não adianta ficar floreando, como nas questões que você tem uma introdução, um texto para depois perguntar. Você tem que ser bem objetivo na pergunta. Eu fazia o seguinte: era a mesma matéria, tinha que responder do mesmo jeito, só era que perguntado de maneira diferente. Agora, uma coisa muito importante é aumentar autoestima dele, porque ele acha que nunca vai aprender. Eu sempre dizia “você é capaz, é inteligente, vai conseguir”, porque ele se achava inferior em relação aos outros, porque os outros faziam rapidinho os cálculos e ele não, então você tem que mostrar à ele que ele é capaz, e às vezes ele tem um grau de inteligência grande, um QI alto, só que tem esse distúrbio na área de exatas.


              Como era o aproveitamento escolar desses alunos em relação aos colegas de classe?
Era bom, porque nas outras disciplinas ele era bom, e só nessas disciplinas de cálculo que ele tinha dificuldade. Aí eu comecei a observar e a partir daí, com essas coisas e fazendo esse trabalho, ele conseguiu.

              Então no início ele tinha notas baixas em matemática e física?
Bem baixas. Se eu entregasse a prova a ele e não falasse nada ele entregava a prova em branco. Ele pegava a prova e falava assim: “eu não vou conseguir”. Aí eu dizia “não, você consegue”! Aí eu sentava do lado dele e lia a prova porque outra coisa interessante é o tutor, ter uma pessoa do lado, um monitor quando tem dificuldade.


 Como você vê essa questão dos distúrbios de aprendizagem?
Eu acho que primeiro, o aluno tem que vir com o diagnóstico e depois você tem que mostrar para o professor o que tem que ser feito, porque o professor muitas vezes não tem o conhecimento sobre o que tem que fazer. Então, primeiro, os pais tem que levar o diagnóstico, porque tem que ter diagnóstico. E depois, a instituição deve encaminhar para um atendimento especializado, dar uma orientação para o professor, o que é o mais importante, porque a grande relação do aluno vai ser com o professor. Mas é fundamental a questão da autoestima.

Você acha que o professor tem suporte para lidar com essa realidade?
A instituição tem que ter um suporte, como um psicopedagogo, mesmo que o aluno já seja diagnosticado, e este suporte deve estar ali para ajudar o professor dando orientações sobre o que ele tem que fazer, mostrando a maneira mais prática e eficiente de lidar com o aluno.

Você acha que os professores estão preparados para essa realidade?
Hoje, na formação do professor ele tá aprendendo sobre isso, e o professor tem que se aprofundar, não tem jeito, porque na faculdade eles dão uma pincelada “olha, existe isso, isso e isso assim”, mas quando você encara a realidade e encontra com o aluno, é aí que tem que procurar qual é o caminho que tem que ser seguido.

            Considera que a mentalidade acerca do tratamento desses alunos tem mudado?
A mentalidade tem mudado bastante. Antes, eles achavam o seguinte: “esse aí vamos deixar de lado porque ele é retardado, ele não vai chegar a lugar nenhum”. Agora não, eles procuram saber o que está acontecendo para poder trabalhar em cima disso.


            O que você acha que um professor pode conseguir realizar em sala de aula para ajudar um aluno com distúrbios? Quais seriam os limites para a atuação do professor?
Primeiro você tem que conhecer o aluno e aí o que acontece é que é muito difícil em uma sala grande, mas você percebe quando um comportamento é diferente dos demais, porque ele quer aprender e não consegue, alguma coisa está dificultando essa aprendizagem. Então eu acho que o professor tem que fazer aí é descobrir que o aluno tem essa particularidade e ajudar e, contribuir para ele se desenvolver. Ele tem que adaptar a avaliação e se adaptar à dificuldade do aluno, o que geralmente não é feito.  Então, o professor tem que ter boa vontade e o suporte.


Entrevista elaborada pelas alunas Dayana Paes de Araujo, Fernanda Christina de A. G. Morisson, Luma Silva Souza e Mírian Belarmindo do oitavo período de Geografia.




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