Sentado no ponto de ônibus olhando
o relógio pela quinta vez. Tendo passado quarenta
minutos e o
transporte não vinha. A tensão de chegar atrasado no primeiro dia de
estágio começava a tomar meu corpo e como primeira consequência começava a
lamentar o fato de ter escolhido uma escola tão distante de minha casa. De
repente o ônibus surge, retomo o ânimo e a empolgação de conhecer uma escola da
zona rural ressurge.
Chegando
à escola sou apresentado à diretora, ao professor com quem estagiarei e me
conduzem por uma rápida visita à escola e em seguida sou conduzido à sala de
aula. Sou apresentado aos alunos e o professor começa a lecionar. Observo-o com
atenção, me imaginando em seu lugar, refletindo sobre o que eu faria de
diferente. Em determinado momento os alunos iniciam uma algazarra e o professor
pede silêncio: "-Moçada vamos lá! Eu ganho para dar aula e não para
aguentar a bagunça de vocês. Aliás, mesmo pra primeira, eu ganho muito pouco."
Ainda refletia o quão diferente seria minha abordagem quando sou surpreendido
por um aluno: "- Que isso fessor, ocê ganha bem pra caramba, eu trabalho
um monte e ganho nem metade do que tu ganha."
Tomado
pelo furor pedagógico realizo minha intervenção, afinal sempre soube que a
profissão que eu havia escolhido seria mal remunerada, mas pensava que isso
seria de conhecimento de todos, mas principalmente que de meus alunos: Inicio
buscando uma abordagem lúdica: "-Vocês viam a Escolinha do professor Raimundo?"
A
classe responde em coro: "- Nãaaaao"
Concluindo
o quanto estou ficando velho, busco uma nova abordagem: " - Vocês sabem
quanto ganha um professor na Coréia do Sul?"
Mostrando-se
resistente meu debatedor dispara: "- Fessor ocê sabe quanto ganha um lavador
de ônibus na Coréia?"
"
- Um lavador de ônibus na Coréia, ganha bem mais do que no Brasil e
possivelmente trabalha menos, pois a lavagem lá é mecanizada, o lavador só
opera o equipamento. O motivo dele ganhar mais que seu colega de ofício
brasileiro é o fato de ele ter tido uma educação melhor e esta diferença
educacional se dá entre outros motivos pelo fato dos professores na Coreanos
ganharem uma remuneração muito melhor do que no Brasil. Todos nós merecemos
ganhar mais, mas para isso é preciso termos uma educação de qualidade e esta
qualidade exige uma remuneração mais digna aos professores." A turma fez
um "uhhh"e o aluno sentou resmungando um "- Tendi." Após o
debate a aula foi encerrada. Enquanto esperava mais uns quarenta minutos pelo
ônibus de volta, ficava imaginando minha próxima intervenção em sala de aula e
desfrutando do prazer indescritível que é ser professor.
O presente conto retrata as aspirações de um estagiário em ser professor, apesar da consciência das questões salariais que envolvem os educadores do Brasil.
ResponderExcluirA constatação da desinformação dos alunos em relação a esse fato, ocorrida durante o estágio, propiciou questionamentos acerca das reais condições de remuneração salarial as quais os docentes brasileiros são submetidos; estando em consonância com o artigo sobre O trabalho docente na educação básica, fornecido pela Equipe Brasil Escola: o qual faz referência às políticas públicas educacionais e seus reflexos nas condições de trabalho dos docentes das escolas públicas da educação básica, que carecem de mínimas condições para desempenhar o seu papel de formadores de cidadãos críticos, objetivando a transformação da sociedade onde vivem ,através de uma escola de qualidade.
As políticas públicas educacionais adotadas para as escolas brasileiras não atendem às reais necessidades dos profissionais de educação bem como a dos educandos.
Percebe-se que os docentes têm seus direitos cerceados pelos atores envolvidos na constituição de tais políticas; pois é de suma importância para a classe dominante manter os profissionais da educação sob “controle”, pois sabem da força que eles possuem . Uma vez bem articulados, serão capazes de desenvolver nos educandos as condições necessárias para compreender os interesses do capital, que objetiva ter cidadãos formados apenas para servirem como mão-de-obra, sustentando o caráter exploratório do capital.
Para reverter essa situação, acredito que a solução seria os detentores do poder respeitarem os direitos dos profissionais da educação e não tratar de forma “maquiada” as questões salariais dos mesmos; uma vez que, estabelecem Leis e Planos para a educação que não demonstram transparências em suas ações.
O Conto “O salário oh!” remete a falta de importância que a figura do professor tem no Brasil e a dificuldade dos alunos e da sociedade em geral entenderem a função social imprescindível do professor dentro da sociedade. A abordagem da estagiária foi uma tentativa tímida porém válida levar a essa compreensão. O artigo “As políticas de formação: A constituição da identidade do professor sobrante da Acácia Zeneida Zuenzer” propõe analisar as nova políticas de formação de professores em face as mudanças ocorridas no mundo do trabalho e com base nas políticas educacionais que elas determinam desde a aprovação da LDB. A autora explica que a crescente incorporação de ciência e tecnologia nos processos produtivos e sociais a serviço do capital vêm exigindo muito mais conhecimento, ampliação da escolaridade, a par de processos permanentes de educação continuada. O professor hoje deve levar o aluno a capacidade de criticar, pensar a realidade, deve cativar a atenção do aluno, ranspor o conteúdo de uma forma que haja assimilação, para isso ele deve conhecer cada etapa da aprendizagem humana . Essa discussão, daria uma aula a partir da intervenção da estagiária, poderíamos analisar os desequilíbrios e desigualdades em nosso país, a falta de investimentos na educação e tudo que o professor enfrenta para desempenhar seu papel a começar por preparar cidadãos que vêm de uma sociedade doente e muitas vezes famílias desestruturadas.
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